Honduras foi por muito tempo o que se convencionou chamar, pejorativamente, de “república bananeira”, um país pobre, onde a economia estaria dominada pela produção de monocultura (da banana, no caso) e pela concentração de terras nas mãos de elites submetidas aos interesses estrangeiros. Neste contexto, depreende-se, claro, a maioria da população estava afastada do sistema político. Durante o período da Guerra Fria, por exemplo, Honduras funcionou como base para operações do exército estadunidense contra a revolução de cunho socialista que se iniciara na vizinha Nicarágua, em 1979. Pode se imaginar que qualquer estabilidade política e a presença de valores democráticos neste país dependeriam, em última instância, dos interesses dos EUA. Assim, os golpes tiveram presença marcante na história do país, pois era interessante a Washington a descontinuidade de projetos políticos populares consistentes no país. Tantos foram as derrubadas de governos que a capital, Tegucigalpa, ficou conhecida como Tegucigolpe.
Pois bem, o que, então, causou sua deposição e exílio? O estopim para que as demais forças políticas hondurenhas depusessem Zelaya foi seu intento de consultar a população para mudanças constitucionais, através da eleição de uma Assembléia Constituinte. Os opositores, contudo, entenderam se tratar de tentativa de manipulação do governo para inserir na nova e futura Carta a possibilidade de sua reeleição (a atual Constituição não permite reeleições). Assim, o golpe se deu, Zelaya foi preso, deposto e deportado. Em seu lugar assumiu o presidente do Congresso Nacional, Roberto Micheletti. Desde então, Zelaya, com apoio internacional, tenta retornar ao cargo, mas até o momento seus esforços foram infrutíferos.
A reação da comunidade internacional à deposição de Zelaya foi de unanimidade na sua condenação. Todos os países e instituições mundiais foram claros sobre a impropriedade do ato e, em coro, exigiram a volta do presidente eleito ao cargo. A Venezuela de Chaves foi a mais contundente em suas críticas e ameaçou intervir militarmente em Honduras contra o governo de Micheletti. A postura de Hugo Chaves se deve ao fato de Zelaya ser seu aliado político no continente e também à participação de Honduras na ALBA - Aliança Bolivariana para as Américas - bloco internacional da qual Chaves é um dos idealizadores, juntamente com Fidel Castro, de Cuba. O governo de Barak Obama, por seu turno, igualmente condena o golpe, mas utiliza apenas recursos diplomáticos para tal, pouco se envolvendo diretamente na situação. Isto porque há setores conservadores estadunidenses (ligados ao partido republicano) muito contentes com a reviravolta em Honduras e, neste caso, o apoio explícito de Obama a Zelaya poderia se reverter em crise interna nos EUA, opondo ainda mais o partido do governo (democratas) e os opositores (republicanos).
A volta de Zelaya só será possível, creio, através de intervenção armada externa, em uma espécie de contragolpe. Isto porque os grupos políticos hondurenhos que o apoiavam mudaram de lado, inclusive seu próprio partido. E também porque todas as tentativas de negociação para a restituição do poder a Zelaya, mediadas pela OEA (Organização dos Estados Americanos) e pelos líderes dos países vizinhos, como a Costa Rica, fracassaram e com o passar do tempo a situação se torna cada vez mais complicada para o líder deposto.
O golpe em Honduras mostra como a democracia é uma realidade ainda frágil no continente americano. Deixa claro que quando se trata de promover reformas sociais e políticas tão necessárias para grande parte da população, há ainda interesses obstantes fortes e organizados, pouco identificados com idéias de participação e decisão popular. Portanto, para quem considerava vivermos em novos tempos de paz, liberdade e igualdade política, fica como lição o golpe hondurenho, talvez não o último que tenhamos visto no continente.
Para saber mais:
Artigos sobre Honduras no Boletim MUNDORAMA, um veículo destinado exclusivamente ao debate de temas da agenda internacional: http://mundorama.net/